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A utilização da arbitragem nos atos societários

Amanda Pegoraro

 A ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 

A arbitragem é um método de resolução de controvérsias alternativo ao Judiciário, que é escolhido em comum acordo entre as partes. Trata-se de um mecanismo que se elege de forma expressa, renunciando à jurisdição estatal. Dessa forma, as partes que fizeram essa escolha submetem seus conflitos a um terceiro elegido por elas, que julgará a controvérsia, em substituição a um juiz do Judiciário. A decisão proferida por esse terceiro, chamado de árbitro, terá força vinculativa, independente de confirmação ou homologação judicial.

A arbitragem no Brasil é permitida para a resolução de conflitos que envolvam direitos patrimoniais disponíveis (aqueles dos quais se pode dispor livremente), de acordo com o art. 1º, da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96). Assim, conflitos que envolvam direitos não disponíveis, como direito a saúde, à vida ou que se refiram ao Direito de Família, por exemplo, são obrigatoriamente resolvidos apenas por meio do Judiciário.

Os conflitos societários envolvem, na grande maioria dos casos, direitos passíveis de serem arbitrados e, em razão do dinamismo da atividade empresarial, além da necessidade de agilidade e flexibilidade para fazer frente à concorrência e às mudanças do mercado, as empresas necessitam de uma solução rápida e especializada aos impasses sociais.

Justamente por isso, a utilização da arbitragem como forma de resolução de conflitos societários vem ganhando cada vez mais relevância no Brasil, tendo se tornado a escolha de boa parte das empresas, interessadas em suas vantagens para resolver os conflitos internos da sociedade com os sócios, os conflitos entre os sócios e os conflitos entre os administradores ou conselheiros com a sociedade ou com os sócios. 

De acordo com a Pesquisa Arbitragem em Números e Valores 2020, produzida pela advogada Selma Lemes, que atuou ativamente na criação da Lei de Arbitragem no Brasil, os conflitos resolvidos com o uso da arbitragem cresceram 73% nos seis anos anteriores. No período, os procedimentos solucionados extrajudicialmente somaram mais de R$ 38 bilhões, a maioria tratando de conflitos societários

 

 FORMA DE UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM NO ÂMBITO SOCIETÁRIO 

Muitos são os conflitos que podem surgir nas relações de direito societário, relacionados à dissolução da sociedade, apuração de haveres, exclusão de sócios, distribuição de lucros, anulação de assembleias e outras deliberações sociais, responsabilização de administradores, entre outros temas.

O modo mais comum de estabelecer a arbitragem como a forma de resolução dos conflitos societários da empresa é inserir cláusula compromissória no contrato social (no caso de sociedade limitada) ou no estatuto social (no caso de sociedade anônima). A cláusula compromissória é o nome que se dá à cláusula que apontará expressamente a escolha pela utilização do instituto da arbitragem, renunciando à jurisdição estatal.

A cláusula compromissória também pode ser utilizada em outros atos societários, como acordos de sócios e demais ajustes ou contratos firmados entre sócios ou com a própria sociedade.

Nesse sentido, com relação às sociedades limitadas, a partir da leitura dos artigos 54, V e 977, do Código Civil (Lei 10.406/02), extrai-se a autorização para que os sócios estabeleçam a obrigatoriedade de utilização da arbitragem no contrato social. Para inserção da cláusula, será necessária a aprovação, em assembleia, de acionistas que representem, no mínimo, três quartos do capital social (artigos 1.071, V, e 1.076, I, e §5º do Código Civil). Caso haja a aprovação, a cláusula vinculará todos os sócios, ainda que ausentes ou dissidentes na deliberação.

Já com relação às sociedades anônimas, o artigo 136-A da Lei 6.404/76 autoriza a inclusão de cláusula compromissória no estatuto social da companhia, vinculado todos os acionistas, inclusive os minoritários e os que vierem a ingressar posteriormente na empresa. O quórum exigido pela Lei para aprovação é de acionistas que representem metade, no mínimo, do capital social votante.

O acionista que não concordar com a inclusão da cláusula, poderá se retirar da companhia, mediante o reembolso do valor de suas ações.

 

 AS VANTAGENS DA UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM NOS ATOS SOCIETÁRIOS 

Os benefícios mais conhecidos da arbitragem são a rapidez no andamento do procedimento e da decisão, a especialização do(s) árbitro(s) julgador(es), a confidencialidade e a flexibilidade das regras procedimentais.

A sofisticação e complexidade que são próprias das relações societárias exigem, no geral, um maior grau de especialização e tecnicidade do julgador. Porém, nem sempre os magistrados estatais têm a formação técnica necessária ou o tempo disponíveis para poder julgar, em tempo hábil, litígios nos quais se discutem questões empresariais complexas e que envolvem conhecimentos apurados do mercado e da realidade empresarial.

A possibilidade de as partes escolherem os julgadores dos eventuais conflitos que surgirem entre si abre a possibilidade para que pesquisem os profissionais mais habilitados e com currículo voltado às questões que poderão ser julgadas. 

Ademais, outro grande obstáculo na utilização do Judiciário nos conflitos societários é a demora na obtenção de solução definitiva, pela grande quantidade de processos atribuída a cada juiz e pela possibilidade de uso de numerosos recursos.

Assim, pelo fato de os árbitros não possuírem a enorme carga de processos que os juízes estatais possuem e diante da inexistência de recursos na arbitragem, a solução arbitral traz a celeridade e velocidade que o mundo dos negócios exige.

A rapidez na solução do conflito é especialmente importante para proteger a estrutura interna da sociedade e a convivência. Quanto mais rápido é o término do conflito, mais rápida torna-se a manutenção da harmonia nas relações entre os sócios e entre estes e a sociedade.

Além disso, a arbitragem é vantajosa pelo caráter confidencial do procedimento e da decisão. A regra é que o andamento do procedimento e a sentença que é emitida ao final são sigilosos, só tendo conhecimento da existência do litígio e acesso às suas informações as próprias partes e seus advogados, além dos árbitros. A confidencialidade evita que os problemas internos, eventuais segredos comerciais da empresa ou outros dados e informações sensíveis sejam levados a público e prejudiquem a sociedade e seus sócios.

Por fim, a arbitragem também é vantajosa pela flexibilidade dos procedimentos, que podem ser feitos “sob medida” para as partes, de acordo com os acertos que fizerem acerca dos prazos, manifestações, provas a serem produzidas, entre outros aspectos procedimentais. Assim, o andamento do processo arbitral pode ser customizado para as necessidades e possibilidades das partes.

As vantagens da utilização da arbitragem para conflitos societários nas empresas são notoriamente reconhecidas, tanto que o Código das Melhores Práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) recomenda o uso da arbitragem para resolução dos conflitos entre sócios, administradores e entre estes e a sociedade.

 

 PONTOS DE ATENÇÃO NA ESCOLHA DA ARBITRAGEM 

Além de seus benefícios, pode-se dizer que a arbitragem também possui algumas características que merecem atenção das empresas antes da realização da renúncia ao Judiciário como julgador dos conflitos societários. Tais características são os custos de um procedimento arbitral, a inexistência de recursos e a dependência do Judiciário para execução da sentença arbitral.

A arbitragem é um meio de resolução de conflitos que, em geral, possui custos de curto e médio prazo maiores que os dos processos judiciais. Isso se deve ao fato de o(s) árbitro(s) receberem honorários pela sua atuação, além de geralmente ser necessário pagar a uma instituição (chamada de câmara arbitral) para que gerencie o procedimento.

Portanto, é necessária a realização de uma análise do custo-benefício das despesas financeiras a serem arcadas na arbitragem, dos valores que são objeto do conflito e do prazo estimado de solução pela via judicial.

A inexistência de recursos no procedimento arbitral, apesar de geralmente ser considerada uma vantagem, já que evita comportamentos oportunistas de se utilizar de inúmeros recursos para atrasar a solução do litígio, deve ser analisada com atenção. Isso porque a impossibilidade de se recorrer da sentença arbitral pode prejudicar as partes no caso de erro na decisão. 

Além disso, é preciso destacar que os árbitros não possuem o poder necessário para executar a sentença proferida. Assim, não é possível que os árbitros ordenem a penhora ou bloqueio de bens da parte condenada, nem outras medidas restritivas do seu patrimônio. 

Dessa forma, a parte vencedora na arbitragem terá, necessariamente, de recorrer ao Judiciário para fazer valer a sentença, caso ela não seja cumprida de forma voluntária pela parte perdedora, submetendo-se ao tempo de decisão da via judicial e à possibilidade de utilização de recursos pela parte executada durante o processo de execução.

 

 A IMPORTÂNCIA DE ESCOLHA DE UM ADVOGADO ESPECIALIZADO PARA UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM 

Por se tratar de conflitos mais complexos e sofisticados, jurídica e tecnicamente, os conflitos societários não exigem somente julgadores mais especializados, mas também advogados bem-preparados e com conhecimento específico da arbitragem e de seu funcionamento.

A assessoria de um profissional habilitado será determinante para orientação do cliente acerca da melhor via de resolução de conflitos no caso específico, se a via judicial ou a via arbitral. Além disso, a cláusula compromissória a ser inserida no contrato/estatuto social ou no acordo de sócios deve ser muito bem redigida, a fim de evitar problemas futuros na sua utilização, que impeçam, prejudiquem ou atrasem a solução dos conflitos que vierem a surgir.

Por fim, a assessoria de uma equipe jurídica especializada também é essencial durante o próprio procedimento arbitral, representando e defendendo os interesses do cliente, além de orientando-o quanto às provas a serem produzidas e estratégias a serem adotadas.



data: março/2023

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